Era seu lar.
Quando percorria o corpo dela com a ponta dos dedos,
desenhando contornos imaginários, esquecia-se de respirar. Seu tato sempre
precisava de uns minutos para recordar os contornos e a textura, pois, na sua
cabeça, sempre era a primeira vez que se encontravam.
Mas em algum momento que ele nunca soube precisar a
velocidade aumentava. Seus dedos não obedeciam mais aos seus comandos: tinham
vidas próprias e agiam ao limite do controle, sem jamais se desordenarem. E todo
o ar que ele havia se esquecido de inspirar vinha, agora, em lufadas de vento
que prenunciavam a tempestade dentro dele.
Logo não sabia mais quem era. Era príncipe e herói, era criança
e sábio, era quem nunca sonhou ser. A cada toque, um choque quase imperceptível
corria pelo seu corpo, praticamente obrigando-o a nunca parar. E ele sorria, às
vezes mexendo a cabeça numa espécie de dança que somente eles conheciam.
Todo seu poder estava na ponta dos dedos. Era assim que a
dominava e fazia com que ela se entregasse. Era assim que ele conseguia
derrotar o olhar desafiador que ela havia lhe dirigido durante o dia inteiro,
provocando-o, instigando-o, convidando-o, ordenando-o. Às vezes ele se atirava
nela em faíscas, mas às vezes fingia fugir em música. Mas de qualquer jeito
sempre respondia, acatava, aceitava, permitia.
Sempre estava percorrendo os dedos por ela, criando mundos que
só podiam ser vistos de madrugada. Todos eles com sua história. Toda história
com seus amores. Todo amor correndo por ela. Toda ela. Todo ele.
Não eram seios ou nuca, não era coxa ou lábios. Era toda ela,
e todo ele na ponta dos seus dedos. Tudo o que sonhava e o queria, tudo o que pensava
e sentia... Nada mais importava. Tudo desaparecia a cada som que ela emitia
respondendo ao seu toque que se tornava cada vez mais feroz e faminto. Os sons
se multiplicavam por toques que ganhavam força e vida e criavam uma memória que
seria vista por mais ninguém. Apenas por ela.
Por toda ela. Todo ele.
E, de repente, explodiam. Ele todo de ansiedade, ela toda de
satisfação. Seus sons diminuíam até o silêncio completo e ele, ofegante, sentia-se
finalmente livre, respirando fundo tentando fazer seu coração perder as batidas
dela.
E seus dedos eram seus novamente. Passava pelos olhos para
afastar o suor e voltar ao mundo real, sabendo que ela ficaria ali, imóvel,
esperando o momento certo. Aí o desafiaria novamente. E ele cairia na
armadilha. Porque ele sempre caía na armadilha, até mesmo quando queria.
Ele era todo dela. Mas ela era todo ele.
Porque ela era seu lar.
Sim, pode ser sexo. Mas também pode ser alguém escrevendo
uma crônica em uma máquina de escrever. Fica a critério do leitor.
2 leitores:
Dedo que operam milagres.
Só eu que pensei num violão ou guitarra =)?
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