Eu fugia do trabalho e você também e passávamos a tarde
escondidos do mundo naquele quarto quente com as paredes transpirando, rolando
na cama e matando uma fome que parecia ser de semanas e o meu cheiro virava seu
cheiro e seu gosto virava meu gosto, tudo isso em meio a gritos e promessas de “para
sempre” enquanto transpirávamos embaçando o vidro da janela. Com a jura de “para
sempre” cumprida de forma instantânea, caímos na cama, encharcados um do outro
e a fome dava lugar à sede e eu, cavalheiro em ao menos um momento, me
levantava para buscar uma garrafa de água.
Você nunca soube, mas eu observava vidrado você sentada na
cama, cabelos ainda grudados nas costas molhadas, virando a garrafa de água no
gargalo dando goles maiores que o mundo. Sua sede era minha sede, sua água era
minha água. Logo na primeira vez que vi você nua bebendo água de forma gulosa
para matar a sede que causei em você soube que jamais me esqueceria daquele
momento. Porque sua sede era minha, seu corpo era meu, seu mundo era eu. Sabendo
que nós ditávamos as regras naquele mundo, você bebia do jeito que te desse
prazer, você bebia vestindo o nada que te caía bem, você bebia apenas por beber
sem se preocupar com nada.
Passamos semanas assim, construindo um mundo de suor e sede dentro
daquele quarto. Não nos importávamos passado nem futuro. Havia apenas o presente
e a água que eu, ainda com as pernas bambas, lhe trazia de presente. E você bebia
com avidez, como se sua vida dependesse disso e eu observava porque a minha
dependia da sua. Às vezes, filetes de água escapavam do seu beijo e escorriam
pelo seu queixo, desembocando no seu colo, onde eu matava minha sede lhe
deixando com fome. E em meio a juras de amor nos alimentávamos um do outros,
nos fazíamos famintos um do outro. Em meio aos “preciso de você” que escapavam
sorrateiros entre um gemido e outro, construíamos um mundo.
E sempre que eu voltava para o quarto e encontrava você deitava
e nua, ainda ofegante, na cama, eu sabia que era para sempre. Eu sabia que tudo
o que precisava era de três ou quatro goles vorazes de água, sem se preocupar se
ela escorria ou não pela sua pele, se ela caia ou não nos lençóis manchados de
nós, para que tudo recomeçasse mesmo sem nunca ter chegado a um fim. E no
primeiro beijo eu sentia sua boca ainda gelada da água e me deixava evaporar
até desaparecer com o vento dentro de você, gritando “para sempre”. Porque era “para
sempre” como um “para sempre” sempre deveria ser: sem começo e sem fim.
Um dia eu voltei para o quarto com a água gelada. Eu jamais
dei um gole, tamanha minha sede em apenas observar bebendo feito você mesma ao
meu lado. E você estava nua e ofegante e suada e satisfeita e faminta como
sempre. Alguns dias depois daquela tarde abafada que eu aproveitei minha mão
molhada e desenhei letras nas suas costas com gotas de água, sem saber onde
acaba a água e onde começava o suor. E entreguei a garrafa para você, ansioso
pelo seu beijo molhado, ansioso por ver filetes molhados descendo pelos seus
seios. Mas você recusou e perguntou se “não tem um copo?”.
Naquele dia, em pé no quarto, suado, eu descobri.
Nada é para sempre.
2 leitores:
Que lindo, Rob... O fim do "para sempre" num copo de água.
Obrigada. :D
Sensacional, Rob!
Postar um comentário