Ela sempre achou que um beijo era apenas isso: um beijo.
Poderia ser longo e demorado, ou curto e roubado, mas não havia muita
discussão: um beijo é apenas um beijo.
Isso até ela se tornar personagem de uma crônica qualquer,
que se passava numa cidade qualquer, no fim da tarde de um dia qualquer.
Chovia, mas não era uma chuva qualquer. Era uma tempestade daquelas de entrar
para a história da cidade. Mas ela não estava preocupada com a história da
cidade, estava preocupada com a história dela. Os gritos da briga – ali, no
meio da rua, no meio da chuva – ainda ecoavam em sua cabeça. Tudo estava acabado.
Todos os sonhos e planos para o futuro haviam se despedaçado e escorrido junto
com a água da chuva para o lugar aonde os sonhos vão quando se tornam
esquecidos. E agora ela estava ali, com frio, roupas encharcadas, e se sentindo
como se a chuva que desabava sobre a cidade caía somente sobre ela. Por um
lado, a chuva não deixaria ninguém ver as lágrimas que escorriam pelo seu rosto
e que começaram a cair antes mesmo dela chegar ao metrô. Sua vontade era
sentar-se na guia e chorar abertamente na chuva, mas estava tentando segurar a
explosão de dor no seu peito até entrar em casa. Não teve chance. Virou-se
quando foi agarrada pelo braço e, ao dar meia volta, deu de cara com ele. Seu
rosto também estava molhado de lágrimas, de chuva, da briga. E de saudade. E de
repente ele disse tudo o que ela precisava dizer. Ela não ouviu nada, talvez
por causa do barulho da chuva, talvez porque ele disse tudo apenas com os
olhos. E a tempestade dentro dela aumentou ainda mais quando as palavras “não
vai embora” trovejaram suavemente em seus ouvidos. E foi quando ela explodiu.
Não de dor, como temia; nem de amor, como imaginava. Explodiu dele. E, molhada,
perdeu o ar respirando a ele. Molhada, deixou-se afogar nos braços dele. E
sorriu ali, feito menina-que-percebe-de-repente-que-vai-ser-menina-para-sempre,
no fim de tarde de um dia qualquer, no meio de uma cidade qualquer, que foi
criada para ser cenário de uma crônica qualquer.
E enquanto as pessoas corriam para escapar da chuva, ela
fechou os olhos e entendeu que um beijo é apenas um beijo quando ele não tem
palavras chovendo em volta dele. E que a palavra “beijo”, na verdade, nem
precisa estar presente. Basta apenas todas as outras serem corretas.
2 leitores:
Ótimo texto, o qualquer nem sempre quer dizer mais um. Pode representar o que realmente importa. Se essa crônica era para ser uma qualquer, conseguiu ser uma qualquer que me fará voltar. =)
só posso dizer: obrigado
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