I
Assim que o bilhetinho dobrado caiu em sua mesa, Mateus
rapidamente o escondeu sob o caderno.
Não precisava abri-lo imediatamente, pois já sabia o que estava
escrito no papel.
Além disso, toda vez que recebia um bilhetinho na sala de
aula, imediatamente era dominado pela certeza de que os outros alunos da classe
haviam percebido, e estavam apenas esperando ele desdobrar o papel para começar a
gritar que ele recebeu um bilhete, que está apaixonado, que está namorando. Já
havia acontecido antes com outros garotos, e Mateus nunca conseguiu imaginar o
que faria se tivesse sido com ele.
Com o papel bem escondido, fingiu que estava prestando
atenção na aula.
Teve certeza de que o professor havia percebido o
bilhetinho caindo em sua mesa, mas não se importou. De todos os professores, o
Wagner era o mais legal e não se importava com essas coisas. Todos os
professores deviam ser como ele. Mas a maioria era como o Celso, que
sempre que descobria um bilhetinho rodando pela sala, confiscava o papelzinho e
o lia em voz alta, fazendo a classe inteira gargalhar e deixando os autores das
pequenas mensagens querendo sumir do planeta.
Quando teve certeza de que havia esperado tempo suficiente
para ninguém mais estar prestando atenção nele, puxou o papelzinho para baixo
da carteira e o desdobrou. Imediatamente, reconheceu a letra de Júlia. Eram
duas perguntas, uma em cada linha:
Hoje?
Em casa?
Em casa?
Dobrou rapidamente o papelzinho e olhou para trás. Júlia se
sentava logo atrás dele, na fileira à sua esquerda. Ela estava olhando para
ele, ansiosa. Mateus rapidamente fez que sim com a cabeça e virou-se para
frente, torcendo para ninguém ter visto nada. E continuou olhando para o
professor, fingindo que nada havia acontecido.
Abaixou os olhos e fingiu que estava escrevendo no caderno.
Não queria olhar para ninguém, pois tinha certeza de que se alguém reparasse
nele, naquele momento, perceberia imediatamente tudo o que ele estava sentindo.
II
Quando o sinal da última aula tocou, Mateus apanhou seus
cadernos e saiu da sala. Estava descendo as escadas quando foi alcançado por
Lucas.
Eram grandes amigos e estudaram juntos desde a infância. Mas
como Lucas havia repetido naquele ano, não estavam mais na mesma sala. Assim, podiam
conversar somente nos intervalos das aulas e no caminho de volta para casa, já
que ambos moravam no mesmo quarteirão e iam embora juntos (de manhã Mateus ia
sozinho para a escola, pois Lucas sempre perdia a hora).
Foi Lucas quem puxou assunto.
- Eu preciso ir ao shopping depois do almoço. Quer ir
comigo?
- Não posso. Vou sair com minha mãe.
Mateus não queria mentir para o amigo, mas também não queria
falar que iria se encontrar com Júlia. Não achava que devia esconder algo de
Lucas, mas se colocasse Júlia na conversa, começaria a ser bombardeado por
perguntas. E Mateus não conseguiria responder, porque não conseguia explicar nem
mesmo para si próprio o que havia entre ele e a garota.
Havia percebido isso alguns dias atrás. Estavam voltando
para casa. Haviam acabado de passar pela padaria quando Lucas perguntou se ele e
Júlia estavam namorando. Mateus tentou fingir surpresa e respondeu apenas que “claro
que não!”, mas imediatamente percebeu que usou o mesmo tom que uma pessoa acusada
de um crime usaria para se defender, e correu para mudar de assunto.
Agora, sempre que o assunto chegava perto de Júlia, Mateus tomava cuidado para fazer a conversa correr em disparada para o lado oposto.
Agora, sempre que o assunto chegava perto de Júlia, Mateus tomava cuidado para fazer a conversa correr em disparada para o lado oposto.
Depois que se despediu do amigo, ficou pensando sobre isso
enquanto almoçava. Todos na escola desconfiavam que Mateus e Júlia fossem
namorados. Ninguém além de Lucas havia perguntado algo a ele, mas Mateus percebia
os olhares, os cochichos e as risadinhas dos outros alunos quando passava pelo
pátio.
E, quanto mais pensava, mais se convencia de que a resposta sincera
para a pergunta que Lucas havia feito alguns dias atrás, se ele e Júlia estavam
namorando, teria sido “não sei”.
Ele e Júlia não estavam namorando. Não que Mateus fosse
especialista no assunto – nunca havia namorado antes – mas sabia, com certeza
que não eram namorados. Nunca havia acontecido nada entre eles, e qualquer
pessoa que já viu um filme ou novela (e Mateus já havia assistido a ambos)
sabia que para estar namorando, era preciso se beijar. Claro que as pessoas nas
novelas eram adultas, e Mateus ficava imaginando se quando ele se tornasse adulto
as coisas seriam finalmente mais fáceis.
Ou, pelo menos, mais claras.
Ou, pelo menos, mais claras.
Pois sabia que ele e Júlia não eram namorados. Mas, por outro lado, Mateus não fazia ideia do que ele e
Júlia eram.
(Continua aqui)
6 leitores:
"Mateus ficava imaginando se quando ele se tornasse adulto as coisas seriam finalmente mais fáceis"
Só piora, Mateus...
Gostei desse começo :)
Levemente arrependido de fazer parte do grupo que sugeriu o texto ser dividido, porque estou agora não levemente ansioso.
Conseguiu, discretamente, demonstrar muito sentimento tipicamente adolescente. Deu pra sentir o frio na barriga que Mateus sentiu quando o bilhete caiu em sua mesa ou quando viu o que estava escrito.
Excelente Rob, excelente introdução, to aqui imaginando os rumos que o texto vai seguir.
Ansioso pela continuação.
Concordo com a Winnie. Só piora.
Adorei os primeiros capítulos, Rob, adorei a ideia da história, adorei o assunto "amor adolescente". Aguardo a continuação.
Beijos.
Caramba! Deixou o texto terminar exatamente na parte que ficou mais interessante! Sacanagem, Rob! Quando sai o próximo capítulo mesmo? Parabéns!
Moço, cê esqueceu de postar o restante da história. Já sei, o PC deu tilte e você esqueceu de salvar, né? Te perdoo...
Amores adolescentes são tãaao sinceros. Uma pena nossos meninos não se interessarem mais por esse tipo de sentimento.
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