- Hoje é meu aniversário.
Ela falou a frase com a mesma naturalidade de quem anuncia
que precisa ir ao banco. Talvez tenha sido que o deixou sem reação. Pego de
surpresa pela informação, conseguiu apenas sorrir e dar um beijo desajeitado no
rosto dela.
- Parabéns!
- Obrigada.
Conheciam-se há poucos dias. As aulas haviam começado menos
de duas semanas antes.
Eram os primeiros dias na faculdade, período em que as
pessoas, jogadas no meio de desconhecidos com os quais teriam que conviver
durante os próximos anos, ainda não descobriram quem serão seus amigos
verdadeiros e ficavam migrando de um grupo para o outro. Ele nunca havia
conversado com ela – já havia reparado nela, especialmente nos olhos verdes –
mas, conversado mesmo, nunca. E calhou de encontrarem no ônibus, voltando para
casa.
E ela, assim, sem mais nem menos, jogou no colo dele a
informação de que era seu aniversário.
- Você não avisou ninguém na classe?
- Não. Eu nunca aviso quando é meu aniversário. Não conte
para ninguém, tá?
- Por quê? Quer dizer, não conto. Mas por que você não avisa
as pessoas?
- Não sei. Acho que não sei lidar direito com tantos parabéns.
Sou tímida.
Ele pensou em responder a ela que “não, você não é tímida,
você é linda e eu sou tímido”, mas foi tímido até mesmo para isso e abaixou os
olhos.
- Bem, parabéns. Mais uma vez.
E se odiou por ter falado parabéns olhando para baixo feito
criança, mas parece que ela não percebeu. Levantou os olhos novamente e
percebeu que ela estava mais linda. Talvez fosse por causa do aniversário, ou talvez
porque o Sol estava batendo nos seus cabelos. Ele lutou para não abaixar os
olhos novamente e conseguiu.
- Posso fazer uma pergunta?
- Claro.
- Por que você disse para mim que é seu aniversário?
- Como assim?
- Você não disse para mais ninguém. Mas contou para mim. Por
quê?
Ela sorriu. Não apenas um sorriso, mas um sorriso de quem-estava-esperando-ele-perguntar-mas-não-acreditava-que-ele-teria-coragem.
- Não sei. Achei que você deveria saber.
Ele sabia que deveria ter segurado na mão dela. Deveria ter
olhado nos olhos dela, ou ajeitado a mecha de cabelos que ameaçava cair sobre
seus olhos. Teve certeza que deveria ter feito tudo isso e ter dito alguma
frase de efeito. Talvez até tê-la convidado para sair.
Mas ainda era moleque, não sabia direito como agir numa
situação como essa. Sentiu sua barriga congelar e teve certeza que estava se
comportando de forma totalmente desajeitada. Apenas sorriu – ele não percebeu,
mas o sorriso saiu mais sincero que ele poderia imaginar – e disse:
- Bem, parabéns. Quer dizer, de novo.
Ela sorriu novamente e se levantou.
- Eu vou descer no próximo.
Ele afastou as pernas e ganhou um beijo estalado no rosto.
- Segredo nosso, certo?
- Certo.
- 10 de setembro. Não esquece.
Ele deu tchau.
E nunca mais esqueceu. Nas semanas seguintes, ela descobriu
suas amigas de faculdade e passou a andar com elas até o final do curso. Ele
também, fez amizade com dois garotos e se fechou neste mundo.
Mas nunca esqueceu. E nunca contou para ninguém. Sabia que
ninguém mais na sala sabia o aniversário da menina de olhos verdes.
E, todo dia 10 de setembro durante os quatro anos seguintes,
ela olhava para ele em algum momento da manhã. E ele sorria para ela. Sorria
morrendo de vontade de que seu sorriso falasse um “seu segredo está seguro”, “eu
nunca me esqueci” ou, com sorte, um “eu queria ter descido naquele ponto com
você no dia do seu aniversário”.
Mas ainda não sabia sorrir tudo isso. Então, seu sorriso
discreto no meio da aula dizia apenas “parabéns”.
E ela sorria de volta.
E o sorriso dela dizia muitas coisas, mas nunca dizia porque
ela tinha escolhido justamente ele.
1 leitores:
Por que será, né? =)
10 de Setembro. Não vamos esquecer.
Bjs!
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