(tema sugerido por: @Vinaa23)
Foi numa terça de manhã, na maior agência bancária da cidade. No prédio de estilo clássico e elegantemente decorado, diversas pessoas esperavam na fila para ser atendidas. O primeiro da fila era um homem de idade avançada, porém ainda encorpado. Não estava em forma, mas bastava uma rápida olhada para ter a certeza de que ele, anos atrás, havia sido forte. Muito forte. Usava chapéu e óculos escuros.
O terminal que indicava os caixas livres apitou e o homem, como indicado, dirigiu-se ao caixa número quatro. Foi atendido por uma moça loira, baixinha e com óculos verdes, que não combinavam com nada. Talvez com o chiclete que ela tinha na boca, mas só. E o chiclete nem era tão esverdeado assim.
- Pois não?
- Bom dia. Eu gostaria de sacar minha aposentadoria.
- Certo. Qual seu nome?
- É... Isto será mesmo necessário?
- Sim, preciso puxar o nome do senhor no sistema.
- Bem... É... Hum...
- Algum problema?
- Na verdade, sim. Meu nome é secreto.
- Como assim?
- Olhe... É complicado... Me diga uma coisa, qual sua idade?
- O que isso tem a ver com o que estamos falando aqui?
- Por favor... Qual sua idade?
A loirinha olhou rapidamente para os lados, se certificando de que ninguém estava ouvindo. Aparentemente, a idade dela era tão secreta quanto o nome dele. Ou mais.
- Trinta e quatro, disse baixinho.
- Então você não irá se lembrar de mim. Mas seu pai se lembraria.
- Como assim?
- Sua família sempre morou aqui na cidade?
- Sim.
- Você nunca ouviu seu pai falar sobre o Capitão Atômico?
- Capitão quem?
- Atômico. Capitão Atômico.
- Não. Sinto muito. O que é Capitão Atômico? Um seriado?
- Não. Capitão Atômico é um... Ou melhor, era um super-herói que combatia o crime nas ruas da cidade. Era um paladino da justiça, o campeão desta cidade. Passou anos enfrentando vilões e protegendo a população. Mas isso anos atrás.
- Ah... Não sabia.
- Não tem problema. Hoje em dia, ninguém sabe mais. Ou não se lembram.
- Mas então... E o seu nome?
O velho suspirou com as duas narinas. Uma delas por tristeza; a outra, por impaciência.
- Eu sou o Capitão Atômico.
Anos antes, esta frase fazia criminosos tremerem de medo. Anos antes, esta frase fazia a população aplaudir para celebrar seu defensor. Anos antes, esta frase era repetida por crianças que fingiam possuir superpoderes para combater o mal. Isso, anos antes.
Agora, tudo o que frase conseguiu foi fazer a menina do caixa assoprar uma bola de chiclete.
- Mas eu preciso do seu nome real para entrar no sistema.
- Eu sei disso. Mas minha identidade é secreta.
- Por quê?
- Como assim? Por causa dos meus inimigos. Preciso me proteger.
- Mas o senhor disse que está aposentado. Ainda tem inimigos?
- Bem, tem razão... A maioria já morreu. Alguns eu nunca mais ouvi falar, mas a maioria está morta...
- Viu só que bom? Então o senhor pode me dar seu nome. Porque Capitão Átomo não vai estar no sistema.
- Atômico.
- Oi?
- Capitão Atômico.
- Que seja. Como o senhor não possui mais nenhum inimigo, não há motivo para ter uma identidade...
- O Enguia!
- Preciso do nome completo, senhor. O “O” é de Oswaldo?
- Não, este não é meu nome. O Enguia é um vilão que ainda está vivo. Ele está num asilo fora da cidade, me lembrei agora. Parece que perdeu um rim, mas está vivo. Ou quase. Não posso contar meu nome enquanto o Enguia não morrer! É um risco grande demais! Era um dos meus inimigos mais poderosos. E certamente o mais inteligente! Não posso correr esse risco!
- E eu não posso sacar seu dinheiro enquanto o senhor não me der seu nome.
- Será que não existe outro jeito?
- Não, senhor.
- Por favor, tente compreender. Antigamente, eu dobrava barras de ferro como se fossem de papel. Aparava tiros de metralhadora com uma mão. Era capaz de levantar automóveis sem grande esforço. Agora, eu mal consigo abrir um vidro de azeitonas. Estou fraco, não consigo trabalhar. E a minha identidade secreta é tudo o que me resta.
- Como assim?
- Se as pessoas descobrirem quem sou, está tudo acabado. Eu me tornarei um homem comum. Mas, se minha identidade permanecer secreta, eu serei lembrado sempre como um mito. E não como um velho que precisa de ajuda para abrir o pote de azeitona, ou geme, à noite, quando se deita.
- Mas o sistema...
- Eu sei, eu sei. Mas estou pedindo para você. Eu tenho aqui os papéis da aposentadoria... Minha identidade secreta era desenhista e tenho aqui os papéis do sindicato. Só o meu nome não está preenchido. Será que não podemos fazer algo a respeito?
A loirinha fez mais uma bola de chiclete. Olhou para o homem por alguns segundos, depois para o computador e de volta para o homem.
- Qual o valor do saque?
O homem lhe entregou os papéis e ela conferiu os números. Não era nenhuma fortuna. E certamente era pouco para alguém que havia arriscado a vida para proteger a cidade. Ou, ao menos, que afirmava ter feito isso. Uma bola de chiclete depois, a loirinha disse:
- Eu vou fazer o seguinte. O senhor preencha o seu nome com a letra mais feia que conseguir.
- O nome mesmo? Pode ser Capitão Atômico?
- Se a letra for feia o suficiente, pode ser Capitão Atômico mesmo. Mas faça uma letra feia demais, quase ilegível. E vamos ver se passa. Como o valor não é alto, ninguém deve reclamar.
O velho sorriu com sinceridade.
- Obrigado. Você é uma boa menina.
- Por nada.
Rabiscou seu nome no papel rapidamente, e entregou à moça. Ela nem conferiu, colocou apenas dentro de uma gaveta e apanhou um maço de dinheiro. Contou as notas e entregou a quantia exata ao homem.
- Agora, na próxima vez, fale diretamente comigo. Ou outro caixa vai implicar com o senhor.
- Obrigado. Qual seu nome?
- Cecília.
- Cecília. Não vou me esquecer. Foi em nome de pessoas como você que combati o crime. Obrigado.
- Tudo bem, senhor. Tenha um bom dia.
O homem colocou o dinheiro no bolso da calça e saiu do banco. Foi direto para um bar recrutar capangas para seu próximo golpe, um assalto a banco que deixaria seis pessoas gravemente feridas.
E tudo isso poderia ser evitado se a garota tivesse ao menos batido os olhos na folha de papel e conferido o nome escrito. Afinal, por mais secreta que seja uma identidade, ninguém tem um nome como “O Enguia ataca novamente!”
- Mas eu preciso do seu nome real para entrar no sistema.
- Eu sei disso. Mas minha identidade é secreta.
- Por quê?
- Como assim? Por causa dos meus inimigos. Preciso me proteger.
- Mas o senhor disse que está aposentado. Ainda tem inimigos?
- Bem, tem razão... A maioria já morreu. Alguns eu nunca mais ouvi falar, mas a maioria está morta...
- Viu só que bom? Então o senhor pode me dar seu nome. Porque Capitão Átomo não vai estar no sistema.
- Atômico.
- Oi?
- Capitão Atômico.
- Que seja. Como o senhor não possui mais nenhum inimigo, não há motivo para ter uma identidade...
- O Enguia!
- Preciso do nome completo, senhor. O “O” é de Oswaldo?
- Não, este não é meu nome. O Enguia é um vilão que ainda está vivo. Ele está num asilo fora da cidade, me lembrei agora. Parece que perdeu um rim, mas está vivo. Ou quase. Não posso contar meu nome enquanto o Enguia não morrer! É um risco grande demais! Era um dos meus inimigos mais poderosos. E certamente o mais inteligente! Não posso correr esse risco!
- E eu não posso sacar seu dinheiro enquanto o senhor não me der seu nome.
- Será que não existe outro jeito?
- Não, senhor.
- Por favor, tente compreender. Antigamente, eu dobrava barras de ferro como se fossem de papel. Aparava tiros de metralhadora com uma mão. Era capaz de levantar automóveis sem grande esforço. Agora, eu mal consigo abrir um vidro de azeitonas. Estou fraco, não consigo trabalhar. E a minha identidade secreta é tudo o que me resta.
- Como assim?
- Se as pessoas descobrirem quem sou, está tudo acabado. Eu me tornarei um homem comum. Mas, se minha identidade permanecer secreta, eu serei lembrado sempre como um mito. E não como um velho que precisa de ajuda para abrir o pote de azeitona, ou geme, à noite, quando se deita.
- Mas o sistema...
- Eu sei, eu sei. Mas estou pedindo para você. Eu tenho aqui os papéis da aposentadoria... Minha identidade secreta era desenhista e tenho aqui os papéis do sindicato. Só o meu nome não está preenchido. Será que não podemos fazer algo a respeito?
A loirinha fez mais uma bola de chiclete. Olhou para o homem por alguns segundos, depois para o computador e de volta para o homem.
- Qual o valor do saque?
O homem lhe entregou os papéis e ela conferiu os números. Não era nenhuma fortuna. E certamente era pouco para alguém que havia arriscado a vida para proteger a cidade. Ou, ao menos, que afirmava ter feito isso. Uma bola de chiclete depois, a loirinha disse:
- Eu vou fazer o seguinte. O senhor preencha o seu nome com a letra mais feia que conseguir.
- O nome mesmo? Pode ser Capitão Atômico?
- Se a letra for feia o suficiente, pode ser Capitão Atômico mesmo. Mas faça uma letra feia demais, quase ilegível. E vamos ver se passa. Como o valor não é alto, ninguém deve reclamar.
O velho sorriu com sinceridade.
- Obrigado. Você é uma boa menina.
- Por nada.
Rabiscou seu nome no papel rapidamente, e entregou à moça. Ela nem conferiu, colocou apenas dentro de uma gaveta e apanhou um maço de dinheiro. Contou as notas e entregou a quantia exata ao homem.
- Agora, na próxima vez, fale diretamente comigo. Ou outro caixa vai implicar com o senhor.
- Obrigado. Qual seu nome?
- Cecília.
- Cecília. Não vou me esquecer. Foi em nome de pessoas como você que combati o crime. Obrigado.
- Tudo bem, senhor. Tenha um bom dia.
O homem colocou o dinheiro no bolso da calça e saiu do banco. Foi direto para um bar recrutar capangas para seu próximo golpe, um assalto a banco que deixaria seis pessoas gravemente feridas.
E tudo isso poderia ser evitado se a garota tivesse ao menos batido os olhos na folha de papel e conferido o nome escrito. Afinal, por mais secreta que seja uma identidade, ninguém tem um nome como “O Enguia ataca novamente!”
10 leitores:
Plot twist. Deveria ser o nome dessa madrugada...
Que puta sacanagem! Quero matar este Enguia.
Comecei pelo fim e já percebi que não vou fazer nada hoje enquanto não ler todos eles. Espero que o dia passe rápido. Beijo.
Hahaha! Demais!!!
Fala sério! Você já estava com essa história guardada em uma gaveta até ela ser sugerida hoje. Não é possível que isso tenha saído agora de sua cabeçinha regada a café!
P.S.: O Engui era realmente muito inteligente...
P.S.2: Capitão Atômico, onde está você?!
PORRA, CECÍLIA! Agora um velhinho deixou de receber seu INSS, porque tenho certeza que O Enguia falsificou esses documentos!
Cecília burra.
Adorei o final. Vc me pegou, hahahaha
Mas a pergunta que não quer calar: cadê o Capitão América?
Ah é, Atômico. Desculpe.
Capitão Atômico! Salve todos nós da mão dO Enguia! Se ele conseguiu roubar um banco só com o dinheiro da aposentadoria, imagina o que ele pode fazer com o que roubou do banco...
Agora vou pensar que todo velhinho na fila do INSS pode ser um herói disfarçado ou um vilão maquinando o próximo golpe, huahuahua.
Hahahaha... vc é doente, né? Só pode!
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