16 de setembro de 2010

O Poeta e a Prostituta

– Ó, a gente pode ficar 30 minutos. Se quiser uma hora, tem que pagar mais. Adiantado.

– Poucos minutos me bastarão.

– É, mas eu tenho que ficar meia hora na rua, porque o Wanderley viu a gente subindo aqui pro quarto. Se eu descer logo, ele briga comigo.

– A mim, basta. Meia hora em tua presença é o equivalente a uma vida inteira.

– Tá. Todo mundo diz isso e depois, fica pedindo mais dez minutinhos. É sempre assim.

– É porque dez minutos com você...

– Eu sei, eu sei. É uma vida inteira.

– Isso! Toda uma doce existência.

– Olha, seu tempo está correndo. Não quer tirar a roupa e deitar, não? Você não vai aproveitar muito ajoelhado aí ao lado da cama.

– Estou de joelhos orando em nome de tua beleza.

– Você tá rezando, é isso?

– Agradecendo por estar vivo no mesmo mundo e na mesma época que você. Oro em nome do fato de poder contemplá-la. Sou um homem fitando uma deusa.

– Bom, se você vai ficar aí rezando, eu vou fumar, ok?

– Quantos homens estiveram tão perto assim de uma deusa? Quantos mortais puderam respirar esta fragrância?

– Ah, dá pra sentir? Tô de perfume novo, o Wanderley que deu pra gente. É bom, né?

– Sentir? Estou embriagado dele, tonto de luxúria.

– Ih, é forte?

– Não, seu perfume abre caminhos, possibilidades! É excitante! Excitante como a vida, como a infância!

– Infância? Cara, eu não mexo com esse negócio de criança. É uma puta duma sujeira isso.

– Não, não estou falando de crianças. Uma criança! Eu! Eu sou tua criança! Eu sou teu infante!

– Ah, tá. Porque criança é roubada. Uma menina lá da rua rodou com a polícia só por causa de umas fotos.

– Afrodite!

– Não, era esse o nome dela. Era... Não lembro o nome. Era uma loirinha...

– Não! Você! Minha Afrodite!

– Bom, meu nome é Natasha, mas você que tá pagando, pode me chamar do que quiser.

– Não sou eu quem chama você de Afrodite, é o universo! Afrodite, recém-criada, ainda reluzindo as gotículas da espuma do mar.

– Mar? Que mar?

– O mar de Chipre! Berço da beleza, a beleza mais pura que já avistei!

– Nunca fui. É perto de Santos?

– É tua origem, e meu destino!

– Eu vou muito pra Praia Grande. Na última vez fui com a minha prima. Mas, nem coloquei o pé na praia, choveu a porra do Carnaval todo e a gente ficou jogando tranca.

– Ah! O carnaval! Você é meu baile de máscaras! Seus lábios formam meu salão, onde me embriagarei de samba a noite toda, até a exaustão!

– Olha, você tem mais dez minutos. Não quer deitar mesmo?

– Quero contemplá-la primeiro. Quero me perder em seus olhos...

– Oi?

– Seus olhos. Eles me lembram jabuticabas reluzindo ao Sol da manhã. O Sol de uma manhã de inverno, no campo... O orvalho derretendo, escorrendo em pequenas gotas, lágrimas de saudade...

– Credo, não sabia que ovário derretia.

– Orvalho. O orvalho de uma madrugada fria e solitária, vivida somente por aqueles que sonham com o conforto da mulher amada. E eu quero me afogar em cada perdigoto deste sonho.

– Aí do lado da cama você não vai se afogar em nada.

– Ah, mas eu mergulharei. E nunca mais voltarei à tona, minha Afrodite, minha deusa, minha...

– Cinco minutos.

– Cinco minutos com você...

– Tá, eu sei. O lance da vida inteira, né?

– Isso. Trocaria encarnações e encarnações por um momento com você.

– Ok, ok... Só tô avisando.

– E depois ainda escrevia poemas de páginas e mais páginas dedicados ao teu beijo, teu sabor...

– Olha, pelo tempo que você tem, vai dar pra escrever um versinho só, e olhe lá. Não quer tirar a calça mesmo? Ainda dá.

– Seria irrelevante, minha alma já está nua, despida de passado e de memórias, por você.

– Bom, então é melhor você mandar tua alma se vestir, porque nosso tempo acabou.

– Oi?

– Como assim, acabou?

– É, deu meia hora já. Preciso entregar o quarto e falar com o Wanderley. E depois vou almoçar um pastel.

– Não! Eu nem comecei ainda!

– Já deu a meia hora. Tô indo.

– Natasha! Por favor!

– Você vai ficar aí?

– Não! Foi rápido demais!

– Você que sabe. Eu tô indo.

– Natasha! Volta!

– Beijo, gato.

– Por favor! Mais dez minutinhos!

5 leitores:

Mari Hauer disse...

É engraçado como as pessoas procuram as coisas sempre no lugar errado! E às vezes isso dá a entender de que elas - as coisas - simplesmente se perderam e deixaram de existir!

Já me senti muito como esse moço, todo carente, buscando carinho e consideração em que só podia me oferecer sexo! Ou querendo conversar de coisas tão simples para mim mas que eram profundas demais de quem sempre viveu no raso! Nada errado com essas pessoas, é só a realidade delas... Eu já tentei diálogos com pessoas que viviam em outro universo como eu. E saí frustrada... se não frustrada, achando que "mais 10 minutinhos" poderiam mudar alguma coisa... Mal sabia eu que nem em meses certas coisas mudariam... Não dá pra criar expectativa em cima de outra pessoa né?

Adorei o texto! :)

Anônimo disse...

Nossa, assino embaixo do que a Mari disse. Depois dessa, nem tenho mais o que comentar.

Varotto disse...

Momento comentário babaca:

Se o corpo é um templo, porque perder tanto tempo rezando na porta, em vez de entrar logo?!

Fim do momento comentário babaca:

P.S.: Suas crônicas de amor, saudades e congêneres são muito boas mesmo, mas eu já estava sentindo falta de uma coisa assim mais divertida... ;o]

Carlos Cruz disse...

Arg, acho que foi um dos primeiros textos que não gostei muito.

O poeta fez um papel literalmente de um bobo, não que ele deveria, como o Varotto disse, entrar logo, mais talvez explicar que a intenção não era nada do que ela pensava, só observar, bater um papo, sendo que ela tambem nem se tocou, e ficou nesse empurra empurra.

Mals, mas acho que critica tambem é bacana as vezes.

Abraço!
Carlos Cruz

MarianaMSDias disse...

É, Rob, o texto é ótimo, mas os comentários da Mari Hauer e do Varotto ganharam todo o brilho, hahaha.

 

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