5 de agosto de 2014

Detalhes

Depois que o café chegou, nenhum dos dois bebeu. Ela parecia perdida em pensamentos, ele parecia perdido nela. Mas quem encontrou as palavras foi ela.

– Você lembra do nosso primeiro encontro?

Ele fez que sim com a cabeça. Sorriu um sorriso pequenininho, e não teve certeza de que ela percebeu. Se percebeu, não falou nada. Ela já estava de volta ao primeiro encontro.

– Você lembra que foi no bar, certo?

– Claro.

– Mas aposto que você lembra pouca coisa além disso. Eu lembro que você chegou quinze minutos atrasado, por causa do trânsito. Estava começando a chover quando você chegou, e nós fomos embora dali debaixo da tempestade. Logo depois de você me contar sobre o livro que estava lendo.

Ele mastigou o biscoitinho que estava ao lado do café. Ela continuou.

– E eu me lembro que estava com um casaco novo. Vermelho, de couro. E, na hora de irmos embora, você tirou sua jaqueta e colocou nas minhas costas, para me proteger da chuva. E nós saímos correndo procurando um táxi, mas não encontramos nenhum. Acabamos ficando escondidos embaixo de um toldo, esperando por um táxi. E, quando eu vi, você estava me beijando.

Ele olhou dentro dos olhos dela.

– Aposto que você não lembrava de tudo isso.

Ele sorriu e abaixou os olhos, dando o primeiro gole no café. Lembrava de tudo. Lembrava com perfeição e até melhor que ela. Por exemplo, sabia que o casaco que ela usara no primeiro encontro era preto. O casaco vermelho realmente era novo, mas ela havia usado somente no segundo encontro.

Mas não contestou o que ela disse.

Se ela se lembrava daquele dia desse jeito, vestindo um casaco vermelho que ainda não existia, não era a memória dela que devia ser corrigida, mas sim a forma como o dia aconteceu de verdade.

Assim, guardou a memória do casaco preto num canto do cérebro e fez com que ela vestisse no primeiro encontro. A partir de agora, ela usaria casaco vermelho sempre que se lembrassem do primeiro encontro. A memória dela sobre como as coisas aconteceram importava mais que a forma que as coisas tinham acontecido. Ele não precisava estar certo, ele precisava proteger as lembranças dela.

– Você sempre se lembrou de detalhes melhor que eu.

Desta vez, foi ela que sorriu.

E, no sorriso, ele entendeu que a história do dia mais especial que havia experimentado estava guardada no lugar certo: dentro dela. Com qualquer casaco que ela quisesse.

2 leitores:

Varotto disse...

Demais.

Pedro Turambar disse...

Ahhh cara...

Você deveria cobrar por conselhos que salvam relacionamentos para a vida toda.

 

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