16 de julho de 2011

#24Horas24Crônicas #7 - Amor de Sábado

(tema sugerido por: @frank_london)

Todo sábado acordava cedo para ver seu amor. Na verdade, quem o conhecia sabia que ele, na noite de sexta, ia dormir cedo e ansioso para o dia chegar logo. E, mal raiava o dia, estava de pé, entrando no chuveiro gelado para despertar. Enxugava-se com a toalha velha sem disfarçar a excitação pelo encontro que se daria em breve, mas mesmo assim gastava alguns minutos colocando a roupa que ele considerava mais bonita: a camisa azul marinho com um desenho no centro.

Com o RG amassado, um maço de cigarros e moedas para a condução nos bolsos, saía de casa naquele horário ingrato, no qual a noite já foi dormir, mas o dia ainda não despertou, preparando-se para a jornada. Quando o Sol terminava de nascer ele já estava cruzando a cidade, com a cabeça encostada na janela, num cochilo que acusava o cansaço da semana de trabalho, num sono que o permitia sonhar que estava com seu amor antes mesmo de encontrá-lo.

Mas às vezes ia acordado, pensando e lembrando e sonhando de olhos abertos. Lembrava-se do primeiro encontro, da paixão que surgiu em seu peito. Lembrava-se de todas as vezes que havia se decepcionado, sorrindo amargo um sorriso de quem sabe que isso acontece, mas o sorriso logo se tornava doce ao festejar o fato de que nunca abandonou seu amor em decepção alguma, e nem nunca o faria.

Sua família já havia se acostumado com a ideia de ele ter um amor de sábado, um amor que morava longe. Seus amigos brincavam com isso, entre uma cerveja e outra, dizendo que ele devia procurar algo melhor para ele, que tinha coisa melhor andando por aí. Ele não dava atenção. Aquele era o seu amor desde o primeiro dia, aquele seria o seu amor até o último minuto.

Do ônibus para o trem, que sacolejava baixinho com ruídos preguiçosos da manhã laranja de sábado. Saía de casa apaixonado e na metade do caminho já estava amando para sempre. Recitava o nome do seu amor, cantarolava sua música predileta e sonhava com momentos que haviam tornado seu passado grandioso e sua história inesquecível. Sabia que tinha sorte por ter um amor de sábado e ser correspondido.

Com as mãos no bolso para guardar a ansiedade de menino que dominava o corpo do homem todos os sábados de manhã, saía pela estação de trem e, controlando-se para não correr, atravessa o terreno baldio sem dificuldades, pois conhecia cada pedra e moita do caminho. E, finalmente, deixava seus olhos brilharem à vontade quando chegava à casa de seu amor, momento pelo qual esperara a semana inteira.

E era ali, quietinho na arquibancada de madeira envelhecida e escurecida pela chuva, que ele observava seu grande amor, o time de várzea que representa o bairro onde havia nascido, entrar em campo desfilando sua camisa azul marinho com o símbolo que ele tantas vezes desenhara nos cadernos quando criança. E, no apito do juiz, travava os olhos naquele campo mal cuidado, com buracos na grama devido ao futebol sem técnica e mal jogado.

Mas jogado com amor.

5 leitores:

K.P. disse...

Time de várzea e poesia, quem diria...

Anônimo disse...

Me lembrou da época em que eu ia assistir os jogos do time do bairro.

Sil disse...

Só você é capaz de me fazer gostar um texto sobre futebol.

Brunín Assis disse...

Meu time nem é de várzea, mas eu me identifiquei tanto com o texto. Amar algo que sempre te decepciona, incondicionalmente...

Mari Hauer disse...

Achei triste e bonito...

 

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